Hoje, durante três horas, fotografei uma modelo lindíssima. Tem vinte e dois anos. Depois filmei-a, a responder a algumas perguntas.
Três horas a olhar para a beleza. Não é como quando uma pessoa bonita passa por nós na rua, nem como quando conversamos com uma. Olhei para ela através da câmara como só olhamos uma mulher que é nossa. Três horas a poder olhar continuamente para uma beleza desconhecida sem ter de disfarçar, a sós com ela na cave escura do lugar onde trabalho. A única luz era a dos projetores. Imaginem a mais bela das moças. Uma esfinge. Fazia-me os poros tremer, morena, animal, tanta-pele, ágil, num silêncio nosso, de um olhar meu, todo atenção.
Era daquelas pessoas que nos fazem confundir a beleza com o amor, e das quais - mesmo eu acreditando que a beleza é uma das provas que Deus existe - me aprendi a afastar, por a atração por elas ser baseada apenas no que não vivi com elas, e não no que vivi.
Mas esta disse-me isto quando lhe perguntei o que é o amor:
Amor? Há vários tipos de amor... Amor de mãe, amor de irmão, amor de amigo, amor romântico... AH, espera, não. Não, só há um tipo de amor.
E eu, espantado, nunca tinha ouvido Só há um tipo de amor?
E ela, olhando para cima (para o amor possivelmente, pela primeira vez) Sim, claro que parvoíce, não há nada vários tipos de amor, é tudo o mesmo! É o amor da família (aqui arregalou os olhos).
Porque quando amamos alguém, queremos que essa pessoa faça parte da nossa família. Não é? Os nossos pais já os amamos, os nossos irmãos também, e os amigos, desejamos que eles façam parte da família, então pronto, só há um tipo de amor. Claro que entre os casais há a atração física, mas isso é a paixão, não é o amor ...
Se calhar vocês já sabiam isto. Mas eu nunca tinha sequer pensado ou ouvido esta ideia. Assim, tão simples.
(o que me fez pensar que ando ou a ler os livros errados ou a dar-me com pessoas demasiado feias)
Uma vida inteira armado em intelectual, e ao contrário do que eu pensava, a vítima da beleza era, evidentemente, não ela, mas eu.
Ela, porque a tem, não é por ela iludida, distingue-a com toda a clareza do amor. Possivelmente por a beleza, ela a ter toda, e ao amor, nenhum, para ela era muito evidente que só há um tipo de amor.
Tenho de me começar a dar com mais modelos.