domingo, 30 de maio de 2010

Gaga-pensamentos

Há pessoas que se fazem passar por pensadores sérios que dizem que não gostam de Lady Gaga. E outras, do mesmo grupo socio-cultural (chamemos-lhes assim), que dizem que adoram a Lady Gaga.

Mas as motivações são, nas primeiras, apenas o ódio ao povo e vontade de pertencer às elites culturais - manifestado pelo ódio ao que é comercial - e nas segundas, serem de tal modo realmente ultra-snobes que chegam ao ponto de terem de disfarçar fingindo que são do povo porque gostam daquilo que o povo gosta.

E no meio disto, onde é que fica a Vida?

Se gostam, assumam que é porque aquelas notas vos excitam pra caralho, que é porque as danças dela vos despertam a libido, ou, se não gostam, assumam que é porque vos repugna aquela mulher meio atrasada mental que não sabe nem dançar nem cantar. Isto ou qualquer outra coisa. Se quiserem. Se não quiserem também está bem.

A Lady Gaga parece-me um dos maiores génios contemporâneos. Odeio-a por tudo aquilo que ela representa: a sociedade em que vivemos hoje de pessoas que só pensam no seu próprio prazer, de pessoas cheias de sentimentos maus, de pessoas superficiais, e acima de tudo, alienadas. Mas amo-a por ela ser um absoluto génio em responder àquilo que o mundo pede. Porque se pede, há uma razão para pedir, e o mundo tem todo o direito de pedir o que quiser. Ela é um génio em perceber exactamente o que isso é, quem são essas pessoas de hoje e em saber falar do sofrimento delas. Amo-a por ela declarar aos berros a todo o mundo que somos uma sociedade de absolutos chalados, de pessoas enlouquecidas, apodrecidas, superficiais, sem norte, sem solução à vista, uma absoluta cambada de alienados.

E é tão comovente o sofrimento que dá para ver nos olhos desta mulher, naqueles videoclipes. Deve ser uma pessoa tão solitária. Ela tão-feia-tão-feia, ali, a mostrar-nos a todos como realmente somos.

Haverá melodia mais grandiosamente excitante que o refrão do Bad Romance? Algo mais épico? E aquela violência? Aquilo é que é estar vivo. Haverá personagem e mulher mais corajosa? Não há. Não há porque hoje não há ninguém que tenha a coragem de dizer a verdade, que é  

I want your love
And I want your revenge
I want your love
I don’t wanna be friends
O o o o o

Porque é que ninguém diz isto? Porque é que anda tudo a fingir que somos todos muito amigos e que o amor não custa? Que quando se perde a pessoa que amamos não há nada que a traga de volta, muito menos a amizade, até porque essa amizade não existe, não é nada comparada com amar?

É que não serve de nada ser amigo de quem se ama em honra dos momentos muito especiais que se viveram, porque isso não é viver, isso é forçarmos-nos a não sentirmos o que sentimos e não sentir é a morte. É o absoluto oposto do amor. É rebaixarmos-nos, não perante os outros, mas perante nós próprios. É não ter orgulho nem honra. A Lady Gaga sabe isto tudo e porra, ela tem a minha idade. 24 anos e olhem onde ela está e olhem para nós. Ela e o Cristiano Ronaldo e Nós Todos.

Claro que o Marylin Manson já nos tinha dito isto tudo há quinze anos. Mas quando ele fica velhinho, está cá a Gaga para nos lembrar.

Claro que o meu mundo era um Mundo onde estas pessoas feias-bonitas não precisassem de existir.  Mas claro que a culpa não é dos artistas. A culpa é nossa.

Nós somos a Lady Gaga.

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