Um momento que me marcou para sempre foi aquele dia no jardim.
Um grupo de actores fazia teatro de rua. Propunham ser mudos. Estavam sempre sérios e eram muito expressivos. Comunicavam batendo em malas de viagem vazias, cada um tinha a sua. Moviam-se em bando, como pássaros, para onde ia o primeiro ia também o segundo, vestidos com roupas minimalistas escuras. Interpelavam os transeuntes com um olhar esbugalhado e ensandecido, assustador, e ficavam parados fitando-nos, batendo nas malas, pedindo-nos para batermos também, esperando uma reacção.
A reacção era contorná-los. Parecia ter sido ganha a proposta estética. Desafiava o outro.
No meio das pessoas passou devagarinho uma velhinha, pequenina, corcunda, de bengala, já sem dentes e com um olhar muito antigo. Ela não percebeu a proposta. Quando eles não perceberam que ela era uma velhinha e ficaram a bater nas suas malas, ela ficou a olhá-los, sem perceber porque não a deixavam passar. Nos olhos deles viu-se imediatamente que não aguentavam o bluff de não serem seres humanos, mas não podiam parar a sua performance. Não sabiam o que fazer e continuaram a bater nas malas e a olhá-la. A senhora ficou a olhá-los com um olhar esgazeado e começou a gemer, como se chorasse, mas zangada. Ela começou a tocar-lhes, pequenina. Foi aí que se percebeu que ela era louca. Quando começou a passar-lhes as mãos pelo peito e pela cara eles não sabiam o que fazer e ficaram quietos. As personagens não estavam programadas para encontrar a vida.
Ela segurava-lhes nas mãos quando chegou a neta e a levou dali dizendo que era a brincar avó, eram actores, era a fingir.
Um grupo de actores fazia teatro de rua. Propunham ser mudos. Estavam sempre sérios e eram muito expressivos. Comunicavam batendo em malas de viagem vazias, cada um tinha a sua. Moviam-se em bando, como pássaros, para onde ia o primeiro ia também o segundo, vestidos com roupas minimalistas escuras. Interpelavam os transeuntes com um olhar esbugalhado e ensandecido, assustador, e ficavam parados fitando-nos, batendo nas malas, pedindo-nos para batermos também, esperando uma reacção.
A reacção era contorná-los. Parecia ter sido ganha a proposta estética. Desafiava o outro.
No meio das pessoas passou devagarinho uma velhinha, pequenina, corcunda, de bengala, já sem dentes e com um olhar muito antigo. Ela não percebeu a proposta. Quando eles não perceberam que ela era uma velhinha e ficaram a bater nas suas malas, ela ficou a olhá-los, sem perceber porque não a deixavam passar. Nos olhos deles viu-se imediatamente que não aguentavam o bluff de não serem seres humanos, mas não podiam parar a sua performance. Não sabiam o que fazer e continuaram a bater nas malas e a olhá-la. A senhora ficou a olhá-los com um olhar esgazeado e começou a gemer, como se chorasse, mas zangada. Ela começou a tocar-lhes, pequenina. Foi aí que se percebeu que ela era louca. Quando começou a passar-lhes as mãos pelo peito e pela cara eles não sabiam o que fazer e ficaram quietos. As personagens não estavam programadas para encontrar a vida.
Ela segurava-lhes nas mãos quando chegou a neta e a levou dali dizendo que era a brincar avó, eram actores, era a fingir.
1 comentário:
Que instante delicado. Apetece colocar num vidrinho e admirar, assim, como fez tão bem com as palavras.
Enviar um comentário