segunda-feira, 4 de novembro de 2013

São sempre precisos Dois para um diálogo.

Uma vez no Rio de Janeiro perguntei ao meu amigo que era filho de pais portugueses, que tinha crescido em França e que estava a viver há um ano e tal no Rio, em que língua ele pensava. Ele disse-me que às vezes dava por si a pensar em inglês.

Uns anos mais tarde, no tempo em que estive mais enamorado, por uma moça que era de outra terra, no primeiro dia desse amor tive de ir de manhã tratar de um documento às finanças a Queluz, numa época em que estava tudo em obras e a repartição era nuns barracões pré-fabricados à volta da estação, e fiz toda a viagem de comboio e passei todo o tempo a conversar com a minha amada na minha cabeça, sozinho, explicando-lhe que lugares eram aqueles, o que já neles vivera, e quais as regras daquela terra.

Eu ainda não sabia que iria um dia ter um ofício internacional, que me faria passar todo o dia a falar com estrangeiros, o ano inteiro a viajar, e que um dia grande parte dos meus amigos mais íntimos seriam estrangeiros. Não sabia que um dia, enquanto vestiria o pijama, iria dar por mim a pensar em inglês.

Percebi nesse instante estarmos a falar com alguém sempre que pensamos. Quando estamos enamorados, falamos com o amado. Muitas das vezes estamos a falar com os nossos pais, ou com os nossos chefes ou colegas de trabalho. Mas com quem estamos a falar a maior parte do tempo?

Com quem estamos a falar quando pensamos que estamos a falar sozinhos? Quando pensamos que estamos a pensar? São sempre precisos Dois para uma conversa.

E antes de haver as palavras, com quem eram trocados os sentidos que brotavam dentro da cabeça dos senhores de há muito muito tempo? Será que pensavam por gestos? Por grunhidos?

De quem era a língua em que falavam?

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