sábado, 29 de novembro de 2008

Um canção para todas as pessoas que não gostam da vida

Já aqui dediquei uma canção à minha futura namorada.

Gostava de hoje dedicar uma a todas as pessoas que não gostam da vida.


Força Estranha

Eu vi um menino correndo
eu vi o tempo brincando ao redor
do caminho daquele menino,

Eu pus os meus pés no riacho.
E acho que nunca os tirei.
O sol ainda brilha na estrada que eu nunca passei.

Eu vi a mulher preparando
outra pessoa
O tempo parou para eu olhar para aquela barriga.

A vida é amiga da arte
É a parte que o sol me ensinou.
O sol que atravessa essa estrada que nunca passou.

Por isso uma força me leva a cantar,
por isso essa força estranha no ar.
Por isso é que eu canto, não posso parar.
Por isso essa voz tamanha.

Eu vi muitos cabelos brancos na fronte do artista
o tempo não pára
e no entanto ele nunca envelhece.

Aquele que conhece o jogo,
do fogo das coisas que são.
É o sol, é o tempo, é a estrada, é o pé e é o chão.

Eu vi muitos homens brigando.
Ouvi seus gritos
Estive no fundo de cada vontade encoberta,

E a coisa mais certa de todas as coisas.
não vale um caminho sob o sol.
É o sol sobre a estrada, é o sol sobre a estrada, é o sol.

Por isso uma força me leva a cantar,
por isso essa força estranha no ar.
Por isso é que eu canto, não posso parar.
Por isso essa voz tamanha.



Caetano Veloso

As meninas e o amor

  • Parte I
Tenho uma amiga que numa viagem há um ano atrás a uma capital europeia, comprou um postal lindíssimo. Esse postal, decidiu, seria para oferecer ao homem da vida dela.
Esse homem seria aquele que mais felicidade lhe trouxesse, mais alegrias, mais risos, mais sonhos acordados, mais sorrisos, mais projetos em comum, mais vida.
Há uns dias atrás, a minha amiga encontrou esse postal perdido no fundo de um armário.
Então ela percebeu que era lá que estava o seu amor. No fundo de um armário, perdido no fundo da cabeça dela. Ela tinha esquecido o amor. Tinha até esquecido que aquele postal já tem um dono, e que é o dever dela restituí-lo.
  • Parte II
Nos últimos dias tenho contado às minhas amigas o quanto preciso do amor de uma mulher amada. Digo-o na esperança de ganhar um beijinho, mas não. Pelo contrário, todas me respondem o que começo a desconfiar ser um código de uma seita feminina qualquer. Sem excepção, todas (até a minha mãe [!!]) responderam aos meus lamentos com Vais encontrar o amor quando menos esperares.
Considero que as mulheres, como um oráculo, têm resposta a todas as questões da vida. Só temos de saber interpretá-las. Inicialmente levei este ensinamento a sério. Não esperei nada. Como quem tem uma dor, tentei não pensar nela (nela dor, ou nela mulher da minha vida, não sei já que não pensei nisso). Tive fé que o amor viria e, sem ânsias, não o esperei. Desconfio que no dia em que me veio bater à porta eu não estivesse em casa.
Foi o mesmo que aconteceu à minha amiga e ao seu postal. O amor não se cruzou conosco.
Assim, enquanto lambia as minhas feridas, pensei melhor. Algo escapava. E foi aí que percebi o ensinamento oculto, que afinal sempre tinha estado lá perante os meus olhos mas que eu não vira. Quando menos esperares dizem elas. Qual é o contrário de esperar? É ir à procura.
Então o ensinamento que eu pensava que me dizia para estar desatentamente à espera de nada, como para passear descansadamente pela minha vida que o amor dobraria a minha esquina, afinal não. Afinal diz para eu esperar o menos possível. Para eu não esperar.
Foram estas duas histórias que me levaram a mudar o rumo da minha vida.
Obrigado bravas meninas.

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Poema XII

Tudo à volta são suicídios lentos.

Meticulosas degradações

subtrações

experiências

na era em que a única arte é a da morte.



Quando um dia sobre os despojos da guerra

só eu e tu restarmos

Quando já não houverem coisas

só meias coisas, escombros



Quando só restarem mulheres enlouquecidas

e homens gastos, ratos

Quando todos os outros falharam

endoideceram

ou se fecharam em caixas e casas,



Aí nos encontraremos, sobreviventes porque inteiros,

eu e tu, mulher sã.

Simples mãe da dignidade, que não pensa, vive

e não destruiu o seu sorriso.



Tratarei de te manter assim,

pois é o meu ofício.

Não há loucura nas flores, nem nas lagoas, nem nos vestidos

de noiva.



Sozinhos eternamente, acompanhados por sermos únicos,

o mundo será nosso

e construiremos cabanas

com trapos

a que outros chamaram bandeiras.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Bons I

"- Qual é a sua política?"

"- A minha política é ser amigo de todos."

- Rui Nabeiro

Uma das pessoas mais exemplares à face da terra.

Olhar as estrelas

Fala-se em olhar as estrelas. Mas poucos realmente olham as estrelas.
Quem olha as estrelas? A maioria sabe que elas lá estão. Não precisa de olhar. Essas são as pessoas para quem saber que uma coisa existe é saber tudo.
É como olhar o fogo. Uma vez conheci uma rapariga que tinha o milagre do fogo nos dedos.
Pegava numa pinha e num tronco duro de madeira e punha-os em cima um do outro e havia uma lareira. Eu e ela olhávamos o fogo. Viamos o fogo queimar, víamos as texturas do fogo, percebíamos que havia um lugar que era o fogo. E havia a madeira. E o fogo e a madeira juntos faziam a madeira desaparecer. O que fica no lugar da madeira? perguntava ela como se fosse criminosamente dona de um milagre.
Quando as pessoas que olham as estrelas olham para elas, vêem como que um pequeno carnaval, uma pequena festa de aldeira com fogo de artifício infinito sobre o vasto negro eterno, a acontecer a milhares de milhões de quilómetros lá em cima.
Já ali em cima de nós, a milhares de milhões de quilómetros. Quando eu olho as estrelas sinto a noite mais quente, e vejo com os meus próprios olhos outras galáxias. Poucas pessoas perdem tempo a olhar as outras galáxias. Essas são as pessoas realmente santas, para quem saber que elas existem basta. As pessoas com o milagre do olhar, olham.
Para elas, olhar é como pensar. Olhar é ser.
Essas pessoas quando olham para uma toalha de praia não vêem um rectângulo, vêem milhões de pontinhas de tecido suave e colorido juntas umas às outras, em muito complexas estruturas, que não é por isso que deixam de ser simples. Essas pessoas vêem numa toalha de praia toda a explicação das estruturas do mundo e percebem como complexidade e simplicidade podem ser sinónimos. Não chamam a isto filosofia.
Às pessoas que olham as estrelas, não é preciso deitar-se na praia para olhá-las, embora seja agradável. Basta-lhes uma janela, numa casa. Basta-lhes o céu.
Estas são pessoas que, como o Teddy, sabem que um braço não existe. Sabem que um braço é só um nome. Sabem que o braço está ligado ao ombro e o ombro ao peito, mas que são tudo uma só coisa. Onde acaba um braço?
Estas pessoas quando vêem madeira não vêem uma superfície, vêem paisagens. São pessoas para quem o tamanho não faz parte das coisas.
São pessoas que vêem os intervalos entre as coisas, e sabem que o nada não existe, só o tudo.
Normalmente são pessoas que dançam bem.
Sabem que a dança reside espaço entre os passos, e que os passos são só uma posição transitória para o corpo se poder mexer de uma posição para outra, que o completa a si mesmo.
Sempre que olho as estrelas lembro-me daquela noite de Verão, na Costa da Caparica quando tinha oito anos e anunciaram os extra-terrestres na televisão. Desde aí que sei instintivamente que o céu está vivo.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

É assim uma espécie de solidão absoluta, que não deve ser consfundida com tristeza. É triste, a solidão, mas não é a tristeza em si mesma. A Solidão é sentir que não há ninguém que queria estar comigo e perceber que também não há ninguém com quem queira estar. Mas que não quero estar sozinho. A solidão é querer estar com alguém que não existe. A solidão pode ser amansada com música da Joanna Newsom, ou com fotografias bonitas a preto e branco, mas não se vai embora. Podemos escrever sobre ela e não se vai embora. Pode ser temperada com mensgens de pessoas a acusarem-nos de não querermos estar com elas como se isso não fosse um direito nosso, mas isso não a torna mais gostosa. E o pior de tudo sobre a solidão é que nem sequer tem um twist final e quando escrevemos sobre ela, o texto parece completamente desprovido de objectivo dramático ou até de importância. Somos só mais um solitário que não consegue dar a volta por cima e vem lamentar-se para um blogue que ninguém lê... É isso que é triste na solidão.

sábado, 22 de novembro de 2008

Charadas I

O Tiago Bettencourt fez à música portuguesa o que o David Fonseca fez à música inglesa.

Poema XI

Há um tempo que não acaba.
Está dentro de nós
e é uma porta de entrada,
onde só a dignidade passa
quando se torna a carapaça
contra a nossa intensa idade.
Contra a explosão dos tempos,
o temporal,
a tempestade.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Poema X

Lamentos corridos
Restam os trilhos
que levam à virtude.

O pré-fabricado

Ele mandou-a calar. Amava-a e não suportava ver lixo sair da boca dela. Só que ele não tinha estudado artes, e o que tomou por lixo era na verdade um ready-made. Ela ficou muito ofendida. Hoje é namorada de um reputado crítico de arte.

domingo, 16 de novembro de 2008

Poema IX

Não fumes.
Vinga antes sobre mim esse desejo
de um prazer que te mate
pouco a pouco.

Guarda esse fôlego.
Se vais morrer nos meus braços
deixa-me ser eu a matar-te
ensinando-te uma nova maneira de respirar.

Une-te a mim para sempre.
Eu sei que assusta porque só a morte é eterna
mas se te casares comigo um bocadinho todos os dias
prometo que morreremos juntos sem darmos conta.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

A moral

Este post é para ser lido ao som desta canção. E tem de estar a tocar muito alto.

- Já a pôs a tocar? - pode continuar:

É para ser ouvida ao som desta canção, porque foi escrita ao som desta canção.
Nada de original portanto, como tudo o resto neste banal - e ao qual uma amiga minha já chamou egocêntrico - blogue. Pois seja já que não há nada a perder.

Foi escrita ao som do

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

do contrabaixo. (Claro que eu a ouvi em disco, pois ainda compro discos).

Hoje estou a usar um perfume que gosto muito. É o truque das pessoas sozinhas, que procuram fazer-se acompanhar da melhor solidão possível. A minha cheira bem, e soa bem.

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

Hoje estava no banho e consegui finalmente pôr por palavras uma ideia que já tinha à muito tempo. Lembrei-me dela porque na novela que dá há hora do almoço a duquesa portuguesa disse aos seus filhos nascidos no Brasil que O amor é uma coisa passageira, as coisas que ficam para sempre são a família e a moral.

Não podia estar mais de acordo. É por isso que se deve tentar construir uma família perfeita. Mas o interessante é que, mais que a família, a moral vem sempre carregada de um peso negativo, diz-se moral e arrepiam-se os cabelos atrás do pescoço. Diz-se moral e aperta-se-nos o coração. E é bom que assim seja.

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

É bom que assim seja porque - e isto foi o que eu consegui pôr por palavras hoje - a moral é boa, o que é mau é obrigar alguém a segui-la. É mau porque é imoral. A moral tem de ser uma coisa que decidimos voluntariamente seguir. Claro, podem dar-nos uma ajuda. Mas obrigar não. E porquê? O Mestre do Tiro com Arco em O Zen e Arte do Tiro com Arco, já aqui citado uma vez noutro contexto, explica muito bem porquê, quando diz ao seu aluno para esticar um arco muito pesado sem fazer força nos braços, só nas mãos, e não lhe diz como. Passa uma semana e o aluno continua a tentar sem sucesso. Passam duas semanas e três e meses, e o aluno é levado ao desespero e à convicção de que é impossível ser virtuoso no tiro com arco. Vê a monstruosidade do seu falhanço. Então chega ao pé do mestre e implora-lhe uma vez mais Explique-me como mestre. E então o mestre explica, e ele consegue. E é aí que o aluno pergunta Porque me levou a este desespero mestre, porque me fez perder todo este tempo e chegar a tamanha frustração? Ao que o mestre respondeu Para que saibas o valor deste ensinamento.

É o mesmo com a moral. Pode-se explicar, mas não obrigar. Cada um tem de fazer muita merda para depois perceber qual é o caminho virtuoso.

Quando tiver filhos - muitos - vou ensinar-lhes a moral, sem os obrigar a segui-la.

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

TUM-TUM; TAM TAM, TUM...

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Sobre o saber ocupar lugar

Os profetas não sabiam só o que ninguém sabia.

Também não sabiam aquilo que todos sabiam.

Foi por isso que foram profetas.

Saber ocupa lugar

Há coisas que é preciso não saber para saber outras. Diz-se que o saber não ocupa lugar, mas não é verdade.

Há saberes que anulam outros. Há saberes que se anulam uns aos outros. Certos saberes ocupam o lugar de saberes opostos a eles. Há quem não perceba isto. Não é complicado. Por exemplo (é sempre mais fácil com um exemplo), é preciso nunca ter "vivido" o que é ter pai e mãe para compreender o que é ser órfão.

Para perceber a vida de outra pessoa, não basta conhecer os elementos que levaram a essa vida. É preciso também ignorar os nossos. E é impossível. Quando falo em compreender, falo em sentir como verdade aquilo que o outro sente como verdade. É isso que é compreender o outro. É compreender tudo nele.

Ora isso é impossível. E era isso que queria dizer às pessoas que tiram conclusões sobre os outros partindo do princípio que os compreendem só porque sabem tudo sobre eles.

Saber tudo sobre alguém, não é saber tudo, na medida em que não se sabe só isso. Na medida em que sabemos algo sobre nós.

Saber tudo é impossível. Para saber umas coisas, é preciso não saber outras. E a cada coisa que aprendemos, estamos a destruir outra que sabíamos, que era o não sabermos. Cada pessoa devia ter muito cuidado com aquilo que aprende.

Partamos do princípio que é impossível alguém compreender completamente outra pessoa e talvez nos consigamos começar a compreender um pouco melhor. Prestar mais atenção ao que podemos, por termos noção do que não podemos.

domingo, 9 de novembro de 2008

Poema VIII

Mulher
Meu gracioso potente porte negro
Que vives a vida como a proa de um navio
Que me beijas a boca como uma mãe que mede a febre
e como uma filhinha que pede beijos antes de adormecer
Os teus lábios reanimam-me numa beira-mar só nossa
onde o único alimento é o sal dos teus cabelos.
Ao meu colo, envolta no teu xaile preto
Fazes lágrimas para me explicares a grandeza do mar

sábado, 8 de novembro de 2008

A arrogância do artista

Recorrentemente encontro pessoas que se surpreendem por os grandes artistas serem arrogantes. Oiço pessoas dizerem que "até gostariam" de tal artista, não fosse tal artista "ser arrogante". Como quem diz Até fazia o esforço de gostar. Nunca percebi estas pessoas.

Tal grande artista não é humilde? Mas já não tinha sido humilde quando decidiu ser grande. Não foi humilde quando decidiu extravasar todos os seus limites e aspirou ser mais de si mesmo do que ele próprio pensava poder ser. Os grandes não foram talhados para a humildade. Por isso é que são grandes. São pessoas que não couberam em si - o que há de mais arrogante que isso? O ponto de partida deles já é a arrogância, não é um ponto de chegada.

Arrogância não é o mesmo que má educação. Arrogância é simplesmente alguém que não aceita ser do tamanho que é. Nem é não aceitar ser pequeno. É não aceitar ser normal. Isso sim, é arrogância. Não é um defeito, também não é uma qualidade. É uma característica. Um aspecto com que alguns cresceram.

Ser artista é ser arrogante, então ser um grande artista só pode ser o cúmulo da arrogância. Fazer uma obra e achar que os outros vão estar interessados? Ou o caso contrário, que ainda é pior, que é fazer uma obra só para si?? Isso além de arrogância já é egocentrismo. Não há por onde escapar, um artista tem de ser arrogante. E não há nenhum mal nisso. Depois de ser arrogante, pode ser ao mesmo tempo simpático, amável, generoso, educado, cortês, delicado - tudo isso são características que um artista, como qualquer boa pessoa, pode e deve cultivar. Mas a humildade não. Só se for perante Deus e, mesmo assim, depende o que cada um entende por Deus. Talvez assim tenha chegado a uma definição de Deus que sinto verdadeira. Deus: a única coisa perante a qual um artista deve ser humilde.

Os grandes artistas são alguém que tem a coragem de olhar nos olhos. Olhar nos olhos o destino, olhar nos olhos os outros, acima de tudo, olhar-se nos olhos a si próprio. Há mais arrogância que isso? Na Coreia (do Norte e do Sul) é má educação olhar nos olhos uma pessoa com quem não sejamos íntimos. É verdade que os artistas com as suas obras nos fazem sentir íntimos deles. Mas isso é porque são capazes de nos dar a ilusão de que os conhecemos, porque na verdade são eles que nos conhecem a nós, e bem demais. Os artistas conhecem-nos melhor que nós próprios nos conhecemos.

Olhar nos olhos um artista é que é arrogância. Porque enquanto que eles nos conhecem melhor que nós a nós próprios, nós nem um miligrama deles conseguimos compreender. E se achamos que sim ainda pior. Ser um grande artista é poder olhar nos olhos alguém mas não o fazer a não ser através da alma. Quando olhamos nos olhos um artista e exigimos que não sejam arrogantes, somos nós que o estamos a ser, por acharmos que somos dignos de pedir o que quer que seja. Pedir? Nós, que não lhes demos nada, ainda lhes exigimos que não sejam arrogantes? Ainda lhes pedimos coisas? Nós é que não merecemos a sua Arte. Não admira que não olhem para nós. Não admira que sejam arrogantes connosco. Quando o mar de críticos só sabe falar do carácter deles quando eles acabam de por uma posta da sua alma ali em exposição para todos verem, não me surpreende que não tenham paciência para os seres pequeninos que lhes apontam o dedo.

E assim concluo que afinal os artistas não são arrogantes. Comparados com o público até são bastante humildes.

Nova definição de artista: ser humilde sendo arrogante.

Nunca confio num artista que não seja assim.

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Poema VII

Fazes esculturas no chá
de não lhe tocares

Aumentas-me a sede
ao respirares

Quando deixas o calor entrar
nos espaços entre as coisas

Constróis na água quente
a beleza dos não lugares


Abraças o passar do tempo
sem nada forçares

Deixas nascer o alimento
fecundado por olhares

E quando nessa flor
acordas o paladar

Libertas nele a cor
do meu sangue a escaldar

Poema VI

Se cada gargalhada

for acabada por ti

e cada lágrima

como aquela que vi

Ao cruzarmos as nossas vidas

até agora mal vividas

talvez conseguíssemos nunca terminar

de juntos celebrar

uma abraço a cada choque

um casamento a cada toque

e seguir a nossa sorte

sem medo nem agonias

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Poema V

Não querias que eu dissesse
aquelas coisas que te faziam corar.

Mas como podia parar
se a cada palavra dita
fazias bonita
a tua beleza aumentar?

Dizias que era especial o que eu fazia
mas estavas enganada.

O que era especial era o que acontecia
quando o que eu fazia te encontrava.

Poema IV

Quando te conheci
Não sonhei que viesses a ser para mim
Metade da toda que és hoje

E se a tua beleza
Não cabe na minha poesia
É para mim um mistério
Como tu cabes em ti

Os olhos

Há uns dias cruzei-me na rua com um amigo. Parámos e falámos de coisas intelectuais e interessantes. Falámos de livros e ele apresentou-me um amigo seu. Esta história começa quando o amigo está a falar e eu reparo nos olhos dele.

Emprenhados pelo Sol laranja de fim de tarde, eram da cor do mel brilhante, como âmbar, mas mais bonitos. Eram intensos e eram elegantes. Fiquei a ouvi-lo mas a certa altura foi como se a voz dele se separasse do corpo e, subitamente, ficasse silêncio, enquanto na minha cabeça fazia um zoom de 46 vezes, 3000 mega-pixels aos olhos dele.

Dei por mim a pensar que aqueles olhos tinham algo de fulminante. Nunca senti atração por um rapaz, mas por aqueles olhos, sim, naqueles olhos eu podia ser feliz. Fiz o zoom out - 46 vezes e 3000 mega-pixels para trás - e vi-me debruçado sobre aqueles olhos, que agora pertenciam a uma moça. Linda de morrer, toda a sua beleza correspondia à daqueles olhos. Como diz o John Cusack no Hi Fidelity, ela compatia a cem por cento com os meus sentidos. E foi aí que percebi pela primeira vez na vida, que os olhos são a única parte do corpo humano que, pelo menos à vista, é igual entre homens e mulheres. E vi a mulher linda que aquele rapaz podia ter sido, no lugar do barbudo que ali estava. Pensei no que poderia ter acontecido entre nós se ele tivesse nascido mulher. E foi assim que nos olhos de um rapaz eu vi a mulher dos meus sonhos.

E percebi que não há nada de homossexual em apreciar os olhos de outros rapazes. Os olhos não têm género, e talvez sejam até a única forma de um rapaz heterossexual ou de uma lésbica apreciarem sexualmente um rapaz .

(a frase Os olhos dela não fazem o meu génro acaba de perder qualquer sentido)

sábado, 1 de novembro de 2008

Poema III

Quando me abraçavas

Sentia que pedias perdão por não seres minha mulher.

Quando me abraçavas

Sentia a tua alma quente nas tuas mãos frias

Quando me abraçavas

Sentia que querias ser mais que uma qualquer mas não sabias

Quando me abraçavas

Sentia que dizias que ali eras mais que uma despedida

Quando me abraçavas

Sentia que já então esculpias a nossa promessa de vida

Quando me abraçavas

Sentia que juravas não querer esquecer

Quando me abraçavas

Sentia que não era só o frio da tua cidade que estavas a aquecer

Quando me abraçavas

Sentia que fugias do beijo que me querias dar

Quando me abraçavas

Sentia que pedias que não te deixasse escapar

Quando me abraçavas

Sentia que nos casavas

Quando me abraçavas

Sentia que nos abraçavas

Quando me abraçavas

Poema II

Mulher robusta

Que encontras nos próprios passos

O caminho da beleza



Mini poema sobre a mulher dos meus sonhos.

Poema I

Eu tinha encontrado em ti

Aquilo que via quando olhava para dentro

Mas que nunca seria capaz de pôr cá fora

E tu ensinaste-me que sim

E chamámos-lhe Ana.



Poema para a minha futura mulher que não sei quem virá a ser, sobre a nossa filha que ainda não nasceu.