quarta-feira, 17 de setembro de 2008

A arte de dormir

Sabem quando os pais vos contam o quanto vocês eram lindos em bebés? Os meus também contam, mas acrescentam logo a seguir que eu dormia pouco e era muito rabugento e mal disposto. Chega a parecer que a minha família mais chegada tem uma espécie de vingança por saldar com essa criança, tal é a ferocidade com que me criticam no passado, como se essa criança morasse dentro de mim e eu fosse agora a única pessoa que lhe pode dar o ancestral tau-tau que ela merece.

Estranho paradoxo, que com a entrada na adolescência tenha começado a ser conhecido por dormir muito. E também por ser bem disposto e otimista. Nos últimos anos cheguei mesmo a ser apontado como exemplo de pessoa feliz.

Recentemente, comecei a trabalhar mais e tenho podido dormir pouco. Para algumas pessoas isto não será nada de especial, mas eu noto que fico incrivelmente mais mal disposto e chato para as outras pessoas. Sem paciência para ninguém. O meu sentido de humor quase desaparece. E todos sabemos que sentido de humor é sintoma de inteligência.

Será que é a falta de sono na nossa civilização - em que cada um tem de trabalhar no mínimo 8 horas por dia - a causa da má-disposição e pessimismo geral da grande maioria das pessoas? De eleições em que ganham políticos pessimistas? Das discussões familiares constantes? Da insatisfação? Do ódio?

Todos devíamos dormir pelo menos 10 horas por dia abraçados a alguém de quem gostamos. Se toda a gente fizesse isso, o mundo seria um lugar muito mais simpático. Menos evoluído, mas muito mais simpático.

Pena que os países latinos estejam a desaprender a arte da preguiça, a arte do descanso. Era um grande contributo que podíamos dar ao mundo. Naturalmente, o trabalho esmaga a preguiça e está a fazê-la desaparecer. O trabalho é ativo, o descanso é passivo.

Mas talvez esteja na hora de uma nova ofensiva do descanso, essa essência do ser humano. Urge inventar o descanso-ativo.

Países latinos - ao trabalho!

(ou melhor, ao descanso)

3 comentários:

Aurora disse...

"trabalhadores de todo o mundo, descansem!" é a última frase do livro de Bob Black, "A Abolição do Trabalho", tradução de Abdoulie Sam Boyd e Lumir Nahodil, Prefácio e capa de José Tavares, 55 páginas, Editora Crise Luxuosa, Lisboa, 1998

Calor Humano disse...

Boa aurora!
Tu és um achado, ainda bem que me achaste o bolgue. Vou já procurar esse livro. És a maior.

Mil beijos para a família

Aurora disse...

na verdade quem achou o livro foi o tomás no meio dos livros de uma amiga nossa, que é quase família. grande fã do livro é a minha mãe, que também já deixou comentário algures por aí :)

o livro, é uma edição tb quase familiar, não sei se encontras, mas pergunta por ele em todas as livrarias e pede a todos os que conheces para o pedirem... (é um plano que nós temos) pode ser que assim essa editora tenha mais saída para os seus interessantes livros.