Ontem foi um dia solarengo. Calmo e silencioso, dava a impressão de se ouvir o movimento do mar ao longe.
Era de tarde e era uma tarde como só em Lisboa pode haver. E eu estava a trabalhar, descansado.
Subitamente ouve-se ao longe um som grave indistinto. Não pára. Começa a aumentar de volume. Parecem explosões, gritos. As pessoas para quem trabalho, mais velhas que eu, olharam para mim assustados incapazes de achar explicação. Mas não ficaram muito tempo com essa expressão. Deu logo lugar a um sorriso condescendente quando lhes disse a explicação provável contemporânea para a algazarra. Devem ser as praxes.
E foi assim que fomos para a varanda ver desfilar a minha geração.
Umas centenas de pessoas, ora vestidos de capa e batina preta, ora de t-shirt branca com a cara pintada e os cabelos enfarinhados, seguravam com uma mão uma cerveja e com a outra um estandarte - como as legiões romanas fizeram outrora - em que estava escrito o nome do seu curso. Urravam. Gritavam as iniciais dos cursos com a energia com que gritariam gritos de guerra. Com um ar sério, os mais velhos tentavam coordenar esta multidão de hooligans com os cérebros temperados em álcool, que disfarçados de estudantes, marchavam não pela rua, mas pelo passeio.
A minha geração sente-se rebelde. Mas que rebeldia é esta que não ousa sair do passeio? Que pára na passadeira? Que avisa a polícia que vai manifestar-se e, pior, manifestar-se sobre nada? Que revolução de vida é essa em que do outro lado da rua as mães, amorosas, fotografam, num comovente esforço de registo da infância interminável dos filhos?
Estes pequenos rebeldes estavam bêbados demais para perceberem que estavam numa festa de aniversário enorme, em que eles, criançada, foram postos para correrem um bocado até se cansarem. É que os meninos, quando ficam grandes, requerem brincadeiras cada vez mais dispendiosas. O Estado paga, pois é preciso divertir estes meninos grandes. Que sorte a deles. Noutros regimes seriam mandados para a guerra. E é assim que em 2008 se gasta a energia que há. Não a melhorar o mundo ou na construção de algo para partilhar com os outros. Gasta-se inconsequentemente. Mas quem sou eu para julgar. Talvez o mundo já esteja tão perto da perfeição que nos possamos dar a estes luxos.
Os recém-licenciados queixam-se de não terem emprego. Se isto faz parte de se tornar licenciado, eu se tivesse uma empresa também não lhes dava emprego.
Nada disto me importava se eu não tivesse de partilhar o mundo com eles. E pensar que daqui a uns anos os filhos destas pessoas vão ser colegas dos meus filhos na escola.
Era de tarde e era uma tarde como só em Lisboa pode haver. E eu estava a trabalhar, descansado.
Subitamente ouve-se ao longe um som grave indistinto. Não pára. Começa a aumentar de volume. Parecem explosões, gritos. As pessoas para quem trabalho, mais velhas que eu, olharam para mim assustados incapazes de achar explicação. Mas não ficaram muito tempo com essa expressão. Deu logo lugar a um sorriso condescendente quando lhes disse a explicação provável contemporânea para a algazarra. Devem ser as praxes.
E foi assim que fomos para a varanda ver desfilar a minha geração.
Umas centenas de pessoas, ora vestidos de capa e batina preta, ora de t-shirt branca com a cara pintada e os cabelos enfarinhados, seguravam com uma mão uma cerveja e com a outra um estandarte - como as legiões romanas fizeram outrora - em que estava escrito o nome do seu curso. Urravam. Gritavam as iniciais dos cursos com a energia com que gritariam gritos de guerra. Com um ar sério, os mais velhos tentavam coordenar esta multidão de hooligans com os cérebros temperados em álcool, que disfarçados de estudantes, marchavam não pela rua, mas pelo passeio.
A minha geração sente-se rebelde. Mas que rebeldia é esta que não ousa sair do passeio? Que pára na passadeira? Que avisa a polícia que vai manifestar-se e, pior, manifestar-se sobre nada? Que revolução de vida é essa em que do outro lado da rua as mães, amorosas, fotografam, num comovente esforço de registo da infância interminável dos filhos?
Estes pequenos rebeldes estavam bêbados demais para perceberem que estavam numa festa de aniversário enorme, em que eles, criançada, foram postos para correrem um bocado até se cansarem. É que os meninos, quando ficam grandes, requerem brincadeiras cada vez mais dispendiosas. O Estado paga, pois é preciso divertir estes meninos grandes. Que sorte a deles. Noutros regimes seriam mandados para a guerra. E é assim que em 2008 se gasta a energia que há. Não a melhorar o mundo ou na construção de algo para partilhar com os outros. Gasta-se inconsequentemente. Mas quem sou eu para julgar. Talvez o mundo já esteja tão perto da perfeição que nos possamos dar a estes luxos.
Os recém-licenciados queixam-se de não terem emprego. Se isto faz parte de se tornar licenciado, eu se tivesse uma empresa também não lhes dava emprego.
Nada disto me importava se eu não tivesse de partilhar o mundo com eles. E pensar que daqui a uns anos os filhos destas pessoas vão ser colegas dos meus filhos na escola.
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